domingo, 7 de setembro de 2014

APENAS DE REALIDADE É IMPOSSÍVEL VIVER, APRENDE ALLAN FELIX APOIADO NO ESPECTRO DE BOGART

O tímido e atrapalhado crítico de cinema Allan Felix (Woody Allen) necessita desesperadamente da realidade para viver, ainda mais depois de ser abandonado pela esposa. Readaptar-se, porém, não é fácil. Ainda mais para quem sempre viveu no cinema e se alimentou dos sonhos e ilusões desse meio. Preocupados com sua falta de traquejo, os amigos mais próximos correm em auxílio. Mas é do universo de referências cinematográficas que chega o reforço mais inusitado: o espectro de Humphrey Bogart caracterizado como Ricky Blaine em Casablanca (Casablanca, 1942), de Michael Curtiz. Sonhos de um sedutor (Play it again, Sam, 1972), de Herbert Ross, foi, ao menos até 1977, o melhor filme de Woody Allen. Ele abriu mão da direção, mas o substituto seguiu fielmente o combinado. Uma feliz conjunção de fatores resultou num trabalho de genial simplicidade, que permitiu reencenar, com outras intenções, o epílogo de Casablanca. A apreciação, originalmente de 1977, recebeu revisão e acréscimos em 1998.







Sonhos de um Sedutor
Play it again, Sam

Direção:
Herbert Ross
Produção:
Arthur P. Jacobs
APJAC Production, Rollins-Joffe Productions, Paramount Pictures
EUA — 1972
Elenco:
Woody Allen, Diane Keaton, Tony Roberts, Jerry Lacy, Susan Anspach, Jennifer Salt, Joy Bang, Viva, Suzanne Zenor, Diana Davila, Mari Fletcher, Michael Greene, Ted Markland, os não creditados Tom Bullock, Mark Goddard e em cenas de arquivo de Casablanca (Casablanca, 1942), de Michael Curtiz: Ingrid Bergman, Humphrey Bogart, Jean De Briac, Paul Henreid, Claude Rains.



Herbert Ross (à esquerda) dirige Woody Allen em filme que este preferiu não realizar


Vi Sonhos de um sedutor entre o alívio e a felicidade. A realização, extraída do roteiro escrito por Woody Allen para sua peça teatral Play it again, Sam, envolveu-me totalmente. De imediato, as primeiras imagens e diálogos lançaram para escanteio a desconfiança que alimentava com Herbert Ross[1] na direção. Mas ele cometeu a proeza de realizar, ao menos até o surgimento de Noivo neurótico, noiva nervosa (Annie Hall, 1977), o melhor filme que Allen jamais fizera, o mais bem acabado e homogêneo do comediante nova-iorquino. Comportou-se, segundo consta, apenas como fiel adaptador das ideias e coordenadas do autor. No entanto, diante dos resultados alcançados isso pouco importa. Mas por quais motivos este filme tanto me seduziu? Pelo determinante papel confiado a Jerry Lacy como fantasma de Humphrey Bogart e a influência que exerce na vida do tímido e inadaptado crítico de cinema Allan Felix (Allen). Os personagens interpretados por Bogart em diversos filmes, acima de tudo o Ricky Blaine de Casablanca (Casablanca, 1942), de Michael Curtiz, agem como grilos falantes de Allan. São suas consciências e conselheiros espirituais. Graças a Sonhos de um sedutor senti que não eram tão estranhos os diálogos que alimentei no meu imaginário, durante a infância e boa parte da adolescência, com os cowboys resolutos interpretados por John Wayne, muito menos os pedidos de aconselhamento a eles dirigidos.


Sonhos de um Sedutor é o infeliz título brasileiro para o delicioso Play it again, Sam. O original remete o espectador à atmosfera de Casablanca. No filme de Curtiz ninguém solicita ao pianista Sam (Dooley Wilson) para tocar outra vez. Ilsa Lund (Ingrid Bergman) lhe pede simplesmente a execução de As times goes by, "pelos velhos tempos": "Play it Sam, play As times goes by". A história muda na reapropriação de Woody Allen. Principalmente por Allan Felix ter Casablanca como filme referencial e recorrente. Ao atravessar fase ruim, de carência afetiva e crise de estima, age como se pedisse a Sam, desta vez por meio do fantasma de Bogart, para repetir a canção; não pelos velhos tempos, mas por ele mesmo, tão necessitado de recomposição afetiva e segurança emocional. Ao contrário do que sugere o enganoso título brasileiro, não há nada de sedutor no solitário e inadaptado Allan Felix. O filme é amargo, como quase todas as realizações de Allen. O tom de comédia só lhe reforça e realça a dramaticidade.


Allan Felix (Woody Allen) e sua sombra, o espectro de Humphrey Bogart (Jerry Lacy) caracterizado como o Ricky Blaine de Casablanca (Casablanca, 1942), de Michael Curtiz


Allan Felix é impagável. Apesar de seu jeito atípico, identifica-se com amplos setores do público. Principalmente pelo fato de amargar problemas considerados banais, mas de pleno conhecimento do indivíduo comum, destituído de traquejo social: insegurança, timidez, carência afetiva, males compartilhados por boa parte dos mortais que habitam os grandes e despersonalizados centros urbanos tomados por solidão e individualismo. Nesses locais proliferam seres perdidos, socialmente inadaptados. Um das formas que encontram para compensar carências, fragilidades e dúvidas é apelar aos personagens fantásticos e supra-humanos criados pelo cinema. Allan Felix está presente em cada um de nós. Ele e seu drama divertem, mas também machucam. Sonhos de um Sedutor é comédia, tragédia, drama e romance. Foi realizado com altas voltagens de inteligência e pontuado com cargas sutis de crueldade.


Allen escreveu a peça pensando em encenação de curta temporada. No entanto, o sucesso foi estrondoso, inclusive junto à crítica. As 60 apresentações inicialmente planejadas na Broadway se transformaram em 453, desde 1969, com lotação sempre esgotada. Logo a Paramount se interessou pela adaptação cinematográfica. Não poupou investimentos, frustrando-se quando a realização não recebeu indicações ao Oscar.


Nos palcos, Allen acumulou a direção com a interpretação do personagem principal. Ao seu lado atuaram os ainda jovens Tony Roberts e Diane Keaton nos papeis de Dick e Linda, respectivamente. Ambos marcam presença na versão para o cinema, recriando os mesmos personagens. O surpreendente Jerry Lacy também viveu no teatro o fantasma de Bogart. Roberts e Keaton foram, durante algum tempo, parceiros habituais de Woody Allen. Sonhos de um sedutor marca a primeira aparição de ambos em trabalho do autor[2]. Foi realizado entre Bananas (Bananas, 1971) e Tudo o que você quis saber sobre sexo e tinha medo de perguntar (Everything you always wanted to know about sex (But were afraid to ask), 1972).


Diante de Allan Felix (Woody Allen) estão os amigos Dick (Tony Roberts) e Linda (Diane Keaton)


Sonhos de um sedutor é comédia romântica coesa, tão emocional como genuinamente divertida. Também trafega no terreno da paródia, diante das muitas brincadeiras referenciais do roteiro com o universo cinematográfico bogartiano. Nisso, é uma belíssima homenagem ao cinema segundo os preceitos da valorização nostálgica aos grandes filmes estadunidenses — moda iniciada por Peter Bogdanovich e ainda em voga no momento da realização.


Allan Felix é inteligente e articulado. Mas não foi feito para a vida real. Seu mundo despenca quando é abandonado pela insatisfeita Nancy (Anspach), cansada com sua falta de traquejo e pragmatismo. E agora? De repente, percebe-se totalmente sem chão, num apartamento pontuado de motivos cinematográficos, dentre os quais vários cartazes de filmes estrelados por Bogart. Os personagens bogartianos repletos de confiança, inabaláveis diante dos problemas, saberiam reagir em situações assim, mas não Allan Felix. Ele até tenta, apelando às bravatas pronunciadas entre quatro paredes. Alega que está livre; sairá à caça e pegará gatas de todos os tipos: swingers, loucas, ninfomaníacas, moralistas, o que for. Mas há muita diferença entre as intenções das palavras e os atos. Allan é um perdedor enrustido; um romântico fracassado com as mulheres. Porém, diante da nova e difícil situação, percebe que não pode viver sempre protegido pela falsa sensação de segurança proporcionada pelas salas escuras dos cinemas e recorrência constante às representações de Humprhey Bogart sempre que é premido pelas mais comezinhas e complexas dificuldades. Mas será mesmo assim? Nem tanto. Do mundo real Allan recebe a ajuda de Dick e Linda, casal amigo. Mas Bogart não o abandona. O onipresente fantasma sempre lhe diz como agir a partir de seus próprios exemplos cinematográficos.


Allan Felix (Woody Allen) na primeira tentativa solo de aproximação de uma garota (Diana Davila)


Devido aos esforços de Dick e Linda, o cotidiano de Allan é preenchido com a dura e difícil realidade. Cheios de boa vontade, fazem o possível para relacioná-lo com mulheres disponíveis. Não faltam conselhos. Mas a proverbial falta de traquejo de Allan sempre põe tudo a perder e o envolve em tremendas confusões. Portanto, o apoio da realidade encontra seus limites. Assim, parece dizer o filme: nem só de realidade vive o homem. Sonhos e fantasias são essenciais aos devidos ajustes. Enquanto Dick e Linda auxiliam por um lado, o espectro de Bogart intervém por outro, nos momentos mais precisos, até tudo se complicar!


Linda é muita próxima a Allan. Gentil, sensível e compreensiva, nutre sincera preocupação pelo amigo. Maternal, quer ajudá-lo de todas as formas. Na verdade, é negligenciada por Dick, profissional sempre ocupado. Este, não importa onde chegue, serve-se do telefone mais próximo para informar o paradeiro aos amigos, colegas e clientes[3]. Está sempre atento aos negócios. Uma viagem de trabalho o afasta temporariamente de Linda. Solitária, ela se estreita mais ao tímido amigo. Acontece o previsto. Ambos são caras metades. Aos trancos e barrancos — graças à sua inépcia — e estimulado pelo cupido sem meias medidas do fantasma de Bogart, Allan se lança sobre a amiga. Ataca-a literalmente com um beijo. A surpresa gera rápido mal estar ao qual se segue curto e desconfortável romance durante a ausência de Dick. Pronto! A situação de Casablanca é recriada em São Francisco, agora transformada, ao mesmo tempo, em Paris e na cidade marroquina do título. O personagem de Roberts se torna o equivalente de Victor Lazlo (Paul Henreid); Linda passa por Ilsa Lund (Ingrid Bergman) e Allan Felix por um muito improvável Rick Blaine (Humphrey Bogart).


Linda (Diane Keaton) no apartamento de Allan Felix (Woody Allen) e junto a motivos alusivos aos filmes estrelados por Humphrey Bogart


Bem ou mal o ausente Dick está sempre presente. Faz a sombra da traição pairar sobre os momentos felizes de Allan. O belo, delicado e atrapalhado romance é invadido por problemas éticos. É indesculpável ter um caso com a mulher do melhor amigo, ainda mais pelas costas deste. Linda, moída pela culpa, sabe que ama o marido e deixa o tímido crítico. Mas a situação não retorna satisfatoriamente ao ponto de partida. Dick desconfia da esposa. Presume que ela teve um caso em sua ausência. Sequer desconfia de Allan. Chega a lhe pedir ajuda para desvendar o mistério. Insatisfeito, resolve deixar São Francisco, sozinho. Ao fim, todos se encontram, à noite, sob neblina, na pista do aeroporto. O final de Casablanca é belamente reescrito, com graça e emoção. Allan, imbuído com o abnegado heroísmo de Rick, reconcilia o casal amigo. Afinal, ele e Linda terão sempre as lembranças de São Francisco, da mesma forma como Paris estará nas melhores recordações de Ilsa e Blaine. A vida volta à normalidade, da melhor maneira. O avião parte com os personagens de Keaton e Roberts. Allan presencia a decolagem acompanhado do fantasma de Bogart. A realidade recuperou seu espaço, mas as influências do cinema forneceram acentos e devidas contribuições ao ajuste. O espectro bogartiano constata o amadurecimento de Allan, agora mais consciente de suas fraquezas e melhor preparado para enfrentar o mundo por conta própria. Ele, por sua vez, estará presente como fonte inspiradora sempre que necessário.


Sonhos de um sedutor é redondo, graças aos momentos finais perfeitamente sintonizados às cenas da abertura. O personagem de Woody Allen estava, desde o começo da história — em que lhe pesem a inadaptação e falta de jeito — predestinado a protagonizar um feito heroico. Parece que ansiava por algo assim, ainda mais se pudesse refazer, com gestos próprios e palavras, o final de Casablanca. No começo, vê-se o close up do sardento e boquiaberto Allan Felix, maravilhado, em êxtase, como se estivesse em transe hipnótico. Está no cinema, diante do epílogo do filme de Michael Curtiz. Sabe os diálogos de cor e salteado. Repete-os junto aos personagens, com as devidas ênfases, principalmente os de Rick Blaine. Allan, sentado, tão pequeno e insignificante, dubla não só falas mas os trejeitos do herói no qual ardentemente se projeta enquanto as luzes estão apagadas. Finda a projeção, vem o reencontro com realidade. O tímido crítico caminha para o exterior iluminado, cabisbaixo, exalando frustração. É como se soubesse de antemão: jamais poderá ser firme, duro, resoluto, direto, heroico e desprendido como Rick. É o que confirma todo o desenrolar de Sonhos de um sedutor. Até o final, quando ele se vê diante de um tenso e angustiante imprevisto: a separação dos amigos que mais preza. Reconciliá-los em nome do amor, da amizade, do bom mocismo e da auto estima será tão heroico como permitir a partida de Ilsa com Victor em prol da causa antifascista. Ficarão as boas lembranças, tanto as de Paris como as de São Francisco, estimulando a continuidade da vida e o enfrentamento de novas batalhas cotidianas às quais se engajarão Rick e seu atrapalhado modelo real. Os motivos que alimentam Allan Felix não são tão gigantescos quanto os decorrentes do segundo grande conflito mundial. Porém, importa de fato aproveitar a chance de refazer o epílogo de Casablanca, crescer como homem e ficar em paz com a consciência. Neste momento, os mortais comuns reunidos como plateia de Sonhos de um sedutor — muitos jamais terão a chance de uma saída heroica de grande amplitude — se sentem recompensados e reconciliados com suas existências. Foram inteiramente reintegrados por Allan Felix às suas limitadas mas não insignificantes parcelas da humanidade.


Linda (Diane Keaton) e Allan Felix (Woody Allen) no dilema de uma relação eticamente impensável


Em Sonhos de um sedutor Woody Allen encontra, por intermédio de Herbert Ross, um fino equilíbrio entre comédia, romantismo e espírito de tragédia. A realização é coesa do início ao fim, ao contrário dos anteriores Bananas e Um assaltante bem trapalhão, que sofriam com as naturais inflexões de suas estruturas episódicas. Cada momento do filme é revestido por humor sofisticado, relacionado às crises existências de Allan, mas em estreita sintonia com passagens mais histriônicas, algumas próximas do pastelão, que evidenciam a inaptidão do personagem. Mas não há como reclamar dessa inusitada mistura, na qual influências do existencialismo de Sartre, Camus e Kirkegaard surgem como que retomadas pela finesse de um Ernst Lubitsch. Mais adiante, ou imediatamente, no mesmo plano, tudo se dissolve em gargalhadas que parecem originadas de um sátiro abastecido pelo humor mais físico e não menos genial de Harold Lloyd ou Stan Laurel & Oliver Hardy na primavera de suas carreiras. Essa inusitada química entre fontes aparentemente tão díspares e não cambiáveis prova que Woody Allen conseguiu, na pele de Allan Felix, a proeza de fazer o espectador refletir e, concomitantemente, estimulá-lo rir com gosto de suas próprias limitações.


O espectro de Humphrey Bogart (Jerry Lacy) incentiva Allan Felix (Woody Allen) a partir para a ação com a garota do lado, a melhor amiga, Linda (Diane Keaton)

  
O roteiro é preciso e espirituoso. O ritmo e a sincronia funcionam perfeitamente. O tom é alegre e descontraído. Brotam improvisos de monta. Woody Allen insere vários cacos em suas falas. Tal situação aumenta a graça, pois apanha os demais atores de surpresa, pondo-os a rir — ainda que tentem se controlar — com determinados atos, tiradas e gestos de Allan Felix. No momento de seu primeiro encontro com Sharon (Sal), arranjado por Dick e Linda, ele se atrapalha por completo com o sobretudo da garota, seu (dele) falatório descontrolado e a perda do domínio das próprias mãos enquanto segurava um disco de Oscar Peterson: nervoso, arremessa-o fora da capa. Também é hilariante a frustrada saída com Julie (Joy Bang), auxiliar de Dick. Devido aos gostos estranhos da menina, terminam num bar de motoqueiros brutamontes. Além de agredi-lo, roubam-lhe a parceira. E o que dizer de sua primeira tentativa solo de aproximação de uma garota (Davila) em uma galeria de arte? Diante de uma tela de Jackson Pollock, Allan pergunta: "O que essa obra comunica a você?". A resposta: "A negatividade do universo; o horrível e solitário vazio da existência; o nada. Percebe-se a situação do homem numa vida levada de modo forçado, sem Deus, eternamente, como se fosse uma pequena chama soprada num imenso cenário contaminado por lixo, horror e degradação; uma existência pontuada de absurdos e inutilidades". Abalado com essa exposição, resolve ser direto: "O que você fará no sábado à noite?". "Cometerei suicídio", diz a moça com voz indiferente. Por fim, totalmente sem jeito, buscando uma saída para o mal estar, pergunta: "E na sexta-feira à noite?". É por tudo isso que se entende o diagnóstico de Allan a respeito de si mesmo: "Eu rejeito antes de ser rejeitado. É uma forma de economizar tempo e dinheiro".


Diane Keaton como a bela, discreta, natural, doce e delicada Linda é uma presença sublime em Sonhos de um sedutor. É a mocinha pela qual todos se encantam. A combinação da sua personagem com Allan Felix resulta numa das mais perfeitas parcerias do cinema. Tony Roberts compõe um Dick afiado, dividido entre o amor por Linda, a amizade por Allan e os negócios que lhe roubam praticamente todo o tempo. É, apesar de suas boas qualidades, um sujeito imerso no pragmatismo egoísta. Sabe que tempo é dinheiro. Dick garante um dos melhores momentos de Sonhos de um sedutor quando confessa a Allan a vontade de confrontar e matar o misterioso amante de Linda, provavelmente um "grande garanhão". Quanto a Jerry Lacy, é um prazer vê-lo bancando Bogart numa bem sucedida atuação, permanentemente caracterizado com capa de chuva, chapéu caindo sobre o rosto e fumando segundo o figurino de Casablanca e do cinema noir. É um anjo da guarda tingido de mundanidade, perfeito em sua composição.


Linda (Diane Keaton) e Allan Felix (Woody Allen) sempre terão Paris em São Francisco

  
Apesar da comicidade amarga, Sonhos de um sedutor faz parte do seleto grupo de realizações que deixam os espectadores de bem com a vida. Não somente por causa do roteiro, das influências de Casablanca, do elenco de apoio e do personagem-espelho de Allan Felix, no qual muitos se reconhecem. Graças, também, ao colorido suave, ligeiramente esmaecido, da fotografia de Owen Roizman, filtrada por uma luz que torna familiares e aconchegantes os ambientes internos e externos. Poucas vezes a cinematográfica São Francisco pareceu tão acolhedora.


Linda (Diane Keaton) e Allan Felix (Woody Allen)


A atuação de Woody Allen lhe rendeu a premiação Fotogramas de Plata, oferecida pela revista espanhola Fotogramas, em 1974, pela melhor performance masculina em realização estrangeira.





Roteiro: Woody Allen, com base na peça Play it again, Sam, de sua autoria. Direção de fotografia (Technicolor): Owen Roizman. Desenho de produção: Ed Wittstein. Decoração: Doug Von Koss. Títulos: Don Record. Montagem: Marion Rothman. Música: Billy Goldenberg. Canções: Blues for Allan Felix de Oscar Peterson; As Time Goes By, tema central de Casablanca, de Herman Hupfeld, e outras melodias compostas por Max Steiner para essa produção. Figurinos: Anna Hill Johnstone. Produtor associado: Frank Capra Jr. Produtor executivo: Charles H. Joffe. Supervisão de produção: Roger M. Rothstein. Consultor de fotografia especial: Keith C. Smith. Assistente de direção: William C. Gerrity. Maquiagem: Stanley R. Dufford. Penteados: Patricia D. Abbot. Eletricista-chefe: John Isaacs. Som: Richard Reitschmann, David Dockendorf. Técnico-chefe: Robert Rose. Segundo assistente de direção (não creditado): Charles Norton. Principal maquinista: Bob Rose. Fotografia de cena (não creditada): Bernie Abramson, Orlando Suero. Guarda-roupa (não creditado): Arnie Lipin, G. Fern Weber. Músico (não creditado): Robert Bain (guitarra). Direção musical (não creditada): Oscar Peterson. Motoristas (não creditados): James Arena, Ribello Mastroianni, William Ryan. Publicidade: Jack Hirshberg. Secretárias da produção (não creditada): Elizabeth Atkinson, Susan Miller, Wendy Stark, Barbara Sundahl, Patrizia von Brandenstein, Meghan Williams. Continuidade (não creditada): Dolores Rubin. Assistente para o produtor associado (não creditado): Stan Scholl. Auditoria (não creditada): Foster Thompson. Agradecimentos a: David Merrick. Serviços de locações (não creditados): Cinemobile. Tempo de exibição: 85 minutos.


(José Eugenio Guimarães, 1977; revisado e ampliado em 1998)



[1] Woody Allen não se interessou pela direção. A justificativa, segundo o próprio autor, decorria do fato de o argumento ser originalmente escrito para o teatro.
[2] Outros filmes de Woody Allen co-protagonizados por Tony Roberts com seus respectivos personagens: Rob: Noivo neurótico, noiva nervosa (Annie Hall, 1977); Tony: Memórias (Stardust memories, 1980); Maxwell: Sonhos eróticos de uma noite de verão (A midsummer night's sex comedy, 1982); Norman: Hannah e suas irmãs (Hannah and her sisters, 1986); e'Silver Dolar' Emcee: A era do rádio (Radio days, 1987). Além de Linda em Sonhos de um sedutor, Diane Keaton interpretou os seguintes personagens em outros filmes de Woody Allen: Luna Schlosser: O dorminhoco (Sleeper, 1973); Sonja: A última noite de Boris Grushenko (Love and death, 1975); Annie Hall: Noivo neurótico, noiva nervosa; Renata: Interiores (Interiors, 1978); Mary: Manhattan (Manhattan, 1979); Nova Cantora do Ano: A era do rádio; e Carol Lipton: Um misterioso assassinato em Manhattan (Manhattan murder mistery, 1993).
[3] Ainda não existiam telefones celulares quando da realização de Sonhos de um sedutor.

4 comentários:

  1. Realmente Sr. Eugênio, é humanamente inviável ( só se o cara for um vagaba profissional) acompanhar todas as informações estéticas que são postadas regularmente. Week by week. A gente fica dragado por uma imensidade de nomes, coisas, lugares e tanto mais. Penso que o blog precise continuar mas urgentemente está se pedindo um livro. Há que compactar isso num formato mais acessível pois a cabeça parece que explode quando tento te acompanhar. Era isso .Você enlouquece a gente. Luis Estrela de Matos

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    1. Caro Luis,

      Penso muito a respeito disso. Tanto que já iniciei um trabalho de organização do material. Mas sinto a sua falta, aqui, por estas bandas, para aquela sua prestimosa colaboração. Então, volte para cá o quanto antes, caro amigo.

      Abraços.

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  2. Eugenio,

    Não conheço muito o trabalho de Allen, principalmente atuando. Porém, descobri que no comando de uma pelicula ele chega a ser magistral, segundo minha concepção.

    Não conheço Sonhos de Um Sedutor, que o muito perfeito Ross dirigiu.

    No entanto, segundo captei na matéria, foi uma fita que ele fez sem suas duas mãos e mente completa atuando, sendo utilizado apenas parte de sua sensibilidade e o seguimento à risca de um roteiro que o Allen exigia não ser alterado.

    Possivelmente, conforme observo muitos elogios à fita, pois o que o Ross faz é sempre digno de elogios, se não tivesse havido a determinação de qualquer alteração no que seria filmado, acredito que este filme poderia ser muito e muito melhor.

    Atuar, ou comandar de mãos atadas, não faz soltar todas as qualidade de um grande artesão. Isso pode ser plenamente captado em Flores de Aço, um dos mais belos, leve,sentimental e bem trabalhado filme do ótimo diretor. Ali ele fez sua arte, seu serviço conforme sua qualidade de extraordinário comandante.

    Em A Garota do Adeus, este mais que delicioso filme, ele não se repete, porém fica claro que ali tem um par de mãos e sensibilidade acima de atenta a tudo, numa composição digna de aplausos e, cujo resultado final, foi um Oscar para o Dreifus, e fato que não foi sem merecimento, pois ele está perfeito no seu papel.

    Vi também Fotloose, porém, além de recordar que foi um filme que me marcou por sua inovação no genero, assim como pela condução no seu comando, eu o confundo muito com outros dois musicais mais recentes e, assim me poupo de dizer algo mais concreto sobre o mesmo. Mas é uma outra fita de rastros luminosos deste digno homem do cinema.

    jurandir_lima@bol.com.br.

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    1. Caro amigo Jurandir Lima;

      O filme "Sonhos de um sedutor" é magistral. E uma das melhores e mais ternas comédias do cinema moderno. Herbert Ross agiu bem na direção, mesmo sendo totalmente obediente às determinações ditadas pelo roteiro de Allen. Este, então, está perfeito no papel de tímido crítico de cinema que só sabe da vida através daquilo que conhece dos filmes. Então, não está preparado para viver. Se ainda não conhece esse filme, procure vê-lo o quanto antes.

      Dos filmes que você lista do Herbert Ross... Ainda não vi "Flores de aço", mas já está à minha disposição. "A garota do adeus" é adorável, marcou época. "Fotloose", confesso, nunca me animei a ver. Agora, diante de sua apreciação, pode ser que a coisa mude.

      Grande abraço.

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