DILBERTO LIMA ROSA: A CASA VAZIA

Um jovem segue de casa em casa a pregar anúncios nas portas fechadas e, algum tempo depois, volta para conferir em qual porta ainda pode restar algum deles colado, o que seria sinal de casa vazia: daí invade, confere a secretária eletrônica com o devido recado da família em viagem, por exemplo, e por lá passa a noite e vive o lugar com toda a sua comodidade e suas memórias, mas não sai sem antes pôr tudo em ordem, inclusive com vários consertos em eletrodomésticos, como uma espécie de “cortesia” pela hospitalidade... E esta é só a premissa de um dos “filmes” contidos no excelente A Casa Vazia, escrito, produzido e dirigido em tempo recorde (desde a pré-produção até a finalização, apenas dois meses!) pelo competente sul-coreano Kim Ki-duk (o mesmo de O Arco).






“Filmes”, sim, pois há mais de um em A Casa Vazia: dois interessantes filmes dentro de um só! E é isso o que torna cada vez mais inventivo o Cinema coreano (que sempre brindou o mundo com grandes artistas criativos em sucessos recentes, como o surpreendente Old Boy, do festejado Park Chan-wook), e que me inspirou a escrever esta pequena resenha só para falar sobre como o amor, tema já tão batido nas repetitivas produções açucaradas norte-americanas do gênero, pode ainda ser mostrado inventivamente de forma inteligente e, o mais surpreendente, sem palavras...


E é assim mesmo o “primeiro filme” de A Casa Vazia: um romance absolutamente sem diálogos entre os personagens principais (os ótimos Lee Seung-Yeon e Lee Hyun-kyoon), insólito e cheio de camadas de leituras sobre o nosso mundo atual (como a falta de identidade própria e de sensibilidade num mundo moderno e globalizado)... Em seguida, na segunda metade, um “novo filme” aflora, bem diferente do anterior e com filosofia diversa da trama até então apresentada, quase uma alegoria sobre a persistência das convicções e sobre o “invisível”! E, meio que sem perceber, o espectador imerge neste intrigante caldeirão!


Lee Hyun-Kyoon e Lee Seung-Yeon


O que parece estranho a princípio – mais ou menos parecido com as esquisitices do diretor norte-americano Quentin Tarantino (não por acaso, adorador convicto do Cinema oriental), acaba cumulando para um final belo e interessante, a fomentar o filme inteiro como uma só grande fábula moderna, sem histrionismos, mas, sim, com uma leveza capaz de contar uma instigante estória e fazer com que a plateia compre qualquer inverossimilhança – especialmente diante de um final “mágico”, com direito a um “sorriso vazio” de canto de lábio em cada um que deixar a sala escura ao final do filme, com uma vontade enorme de falar com a primeira desconhecida da poltrona ao lado...


(Dilberto L. Rosa, outubro de 2006)


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