domingo, 6 de setembro de 2015

"ÂNGELA" E A VERA CRUZ ENTRAM SEM SORTE NO JOGO

Ângela (1951), de Abílio Pereira de Almeida e Tom Payne, é o terceiro longa metragem da Companhia Cinematográfica Vera Cruz. Ainda na fase de pré-produção a crise se abateu sobre a empresa e provocou o rompimento de Alberto Cavalcanti com o proprietário e fundador Franco Zampari. O roteiro de Anibal Machado, Nery Dutra e Calvalcanti é baseado em conto de T. A. Hoffmann. Encena um drama sobre o vício do jogo a partir das reminiscências de Dinarte (Alberto Ruschel), casado com a infeliz personagem-título (Eliane Lage). A narrativa, ordenada segundo o continuum apogeu-queda-redenção, é vítima do moralismo exacerbado e dos diálogos altissonantes - francamente artificiais. A apreciação a seguir é de 1993.







Ângela

Direção:
Abílio Pereira de Almeida, Tom Payne
Produção:
Abílio Pereira de Almeida, Tom Payne, Pico Piccinini
Companhia Cinematográfica Vera Cruz
Brasil — 1951
Elenco:
Eliane Lage, Alberto Ruschel, Mário Sérgio, Ruth de Souza, Abílio Pereira de Almeida, Inezita Barroso, Luciano Salce, Maria Clara Machado, Milton Ribeiro, Margot Pollice, Renato Consorte, Nair Lopes, Ester Penteado, Luiz Calderaro, Xandó Batista, Nelson Camargo, A. C. Carvalho, Albino Cordeiro, Margot Bittencourt, Roberto Assumpção, Adolfo Barroso, Edson Borges, Lúcio Braun, Sérgio Cardoso, André Chaim, Angelo Dreos, Kleber Menezes Dória, Maria Sá Earp, Antunes Filho, Jerry Fletcher, Noris Gastal, Sérgio Hingst, Milton Luiz, Nydia Lícia, Jordano Martinelli, Agostinho Martins Pereira, Pio Piccinini, Tony Rabatoni, José Renato, Carlos Thiré, Oswaldo Vidigal, Gerda Edith Ziemens.



Os diretores Abílio Pereira de Almeida e Tom Payne



Ângela é melodrama carregado. Teve produção iniciada por Alberto Cavalcanti. A direção seria de Martins Gonçalves. Porém, a precoce crise que atingiu em cheio o modelo de cinema da Vera Cruz provocou mudanças radicais. Cavalcanti abandonou o cargo de Produtor Geral da companhia após desentendimentos com o fundador e proprietário Franco Zampari. Também deixou o filme. Sua saída, em consequência, levou ao afastamento do diretor. Foram substituídos pela dupla Abílio Pereira de Almeida e Tom Payne.


Quase totalmente filmado em Pelotas, no Rio Grande do Sul, mas também com locações no Rio de Janeiro e nos estúdios da Vera Cruz em São Bernardo do Campo, São Paulo, Ângela conta a triste sina de Dinarte (Ruschel), jogador compulsivo. A vida ganha em cassinos e casas de apostas também repercute negativamente naqueles que convivem ao seu lado. Ângela (Lage) logo tomará ciência do drama. Apesar de tudo, casam-se. Da união nasce uma filha.


Dinarte (Alberto Ruschel), o jogador

Ângela (Eliane Lage) e Dinarte (Alberto Ruschel)

Ângela (Eliane Lage), Dinarte (Alberto Ruschel) e a filha do casal


É tarde da noite quando o filme começa. O Coronel Gervásio (Pereira de Almeida) — membro da decadente aristocracia rural sulista, também prisioneiro da jogatina — perdeu a casa para Dinarte. O impulsivo vitorioso deseja tomar posse do imóvel o quanto antes. Juntos chegam ao local. A hora se revela imprópria, pois a esposa do Coronel acabara de falecer. Nesse clima de pesar, o novo proprietário conhece Ângela, filha adotiva do derrotado. Apaixona-se de imediato. Por isso permite que a família continue a residir no lugar.




Acima e abaixo: a infeliz Ângela, interpretada por Eliane Lage


A história é desenvolvida em flashback por Dinarte. No centro de tudo está Ângela. Ela troca o amor estável com o militar Jango (Mário Sérgio) pela vida inconstante com o jogador. O filme conta a sua luta para livrar o marido do vício, tendo em vista a ruína que se abateu sobre o Coronel. Apogeu, queda e redenção ordenam a narrativa. O moralismo sem peias domina do início ao fim. Mas se fosse apenas isso tudo ainda estaria bem para Abílio Pereira de Almeida e Tom Payne. O problema básico de Ângela são os diálogos, excessivamente empolados. Soam falsos. A altissonância carregada e artificial dos atores põe tudo a perder. É um filme velho, não devido à idade, mas à estética de sua composição — francamente calcada na linguagem das radionovelas. Resiste como curiosidade e assim deve ser visto, inclusive para se evitar a pior forma de fazer cinema.


O casal Dinarte (Alberto Ruschel) e Ângela (Eliane Lage)

Vanjú (Inezita Barroso) e Dinarte (Alberto Ruschel)

Vanjú (Inezita Barroso) e Divina (Ruth de Souza)


Apesar de suas fragilidades Ângela rendeu premiações para Luciano Salce e Ruth de Souza. Foram considerados, como coadjuvantes, Melhor Ator e Melhor Atriz. Receberam os prêmios Governador do Estado de São Paulo — também conquistado por Pierino Massenzi pela Melhor Cenografia — e da Associação Brasileira de Cronistas Cinematográficos.






Direção de fotografia (preto e branco): H. C. Fowle. Roteiro: Alberto Cavalcanti, Nery Dutra, Anibal Machado, baseado em Sorte no jogo, conto de Ernst Theodor Amadeus Wilhelm Hoffmann. Administrador de produção: Pio Piccinini. Assistente de produção: Geraldo Faria Rodrigues. Cenografia: Pierino Massenzi. Assistente de cenografia: Luiz Sacilotto. Chefe eletricista: Rubem Bandeira. Assistente de direção: Agostinho Martins Pereira. Chefe de edição: Oswaldo Hafenrichter. Montagem: Edith Hafenrichter, Oswald Hafenrichter, Alvaro de Lima Novais, Ladislau Babuska. Maquiagem: H. E. Jerry Fletcher. Som: Erik Rasmussen. Assistentes de som: Michael Stoll, Ove Schirm, Boris Silitshau. Música e direção musical: Francisco Mignone, regendo a Orquestra Sinfônica do Teatro Municipal de São Paulo. Continuidade: Bernadete Ruch. Assistente de maquiagem: Valerie Fletcher. Penteados: Gerda Edith Ziemens. Assistentes de câmera: Carlo Guglielmi, Jaime Pacini. Operador de câmera: Robert Huke. Assistente de fotografia: Carlos Guglielmi. Canções: Quem é, de Marcelo Tupinambá; Enquanto houver, de Evaldo Ruy, interpretação de Marisa Sá Earp. Tempo de exibição: 106 minutos.


(José Eugenio Guimarães, 1993)